sexta-feira, 20 de janeiro de 2012

Nada somos alem daquilo que recordamos


Observe sua cidade. Sua sociedade. 

        por Mariana Corteze*

Com a agitada rotina diária e excesso de afazeres em pouquíssimo tempo, é possível compreender que as pessoas deixam de lado a capacidade de observar. Em um mundo que se modifica a cada instante ainda existem resquícios que possibilitam a recordação de algo que já se passou, mas para percebermos essas lembranças é preciso analisar o meio onde se vive, sendo dos pequeninos detalhes até as atitudes individuais e coletivas que nos rodeiam.

        A imagem do ambiente em que vivemos segundo Lynch (1997) é uma arte temporal que acontece em ocasiões diferentes para pessoas diferentes, tendo as sequências invertidas, interrompidas, abandonadas e atravessas, gerando assim a oportunidade constante da transformação do mundo urbano numa paisagem passível da imaginibilidade. A cidade é um lugar espacialmente organizado e nitidamente identificado, impregnado pelos significados e relações atribuídos por cada cidadão (LYNCH, 1997), pois cada um estabelece a sua própria rede de associações com o espaço vivencial.

        Nas cidades proliferam marcas e sinais que contam uma história visual das relações do homem com o meio, resultantes do conjunto de valores, usos, hábitos, desejos e crenças de cada comunidade. Nesse sentido, é possível refletir sobre experiências de olhares sobre o espaço urbano.

        A imagem da cidade é constituída pelo espaço e decorrente da necessidade de criá-lo, tanto nas transformações horizontais, como verticais. Essas transformações são representadas por textos não-verbais (FERRARA, 1997) que acompanham as nossas andanças pela cidade, produzem-se, completam-se, alteram-se ao ritmo dos nossos passos e, sobretudo, da nossa capacidade de perceber e registrar as informações.

        Sendo assim, a cidade pode deixar de ser vista como espaço abstrato das especulações projetivas, sociológicas ou econômicas, para ser apreendida como espetáculo, como imagem e compreender a importância da observação da paisagem e detalhes que nela se encontram. No entanto, cada indivíduo percebe o entorno espacial através de um olhar particular, subjetivo, decodificando as mensagens impregnadas de filosofias, ideologias e emoções,
mescladas às memórias subjetivas.

        Cada memória é única e constitui nossa identidade, ou seja, “nada somos além daquilo que recordamos” (I. Izquierdo). De acordo com Tadesco, memória é a matriz da história e os lugares necessitam de pessoas que garantam reprodução e temporalidade da capacidade de observar.

        A recordação de ambientes, objetos, situações colaboram para (re)enquadrar os fatos temporais e evitar os seus desvios. As narrações expressam experiências de vida; são mediações simbólicas na interpretação do mundo e dos significados que indivíduos e grupos sociais carregam.

        Assim, é evidente a importância de parar por um instante e observar o ambiente onde se vive. Pois é por meio da linguagem visual que podemos estabelecer relações com o mundo, comunicar experiências, fundar tradições comuns, subjetivar experiências, intercambiar e se apropriar de símbolos e de memórias coletivas (Bosi, 1994).



(*) Mariana Corteze é Técnica em Design Gráfico.
<> Fale c/ a colunista: maricorteze@hotmail.com





REFERÊNCIAS
BOSI, E. Memória e sociedade: lembrança de velhos. São Paulo, SP: Companhia das Letras, 1994.
BRANDÃO, Vera Maria Antonieta Tordino. Labirintos da memória: quem sou? São Paulo, SP: Editora Paulus, 2008.
FERRARA, Lucrécia D’Aléssio. Leitura sem palavras. 4ª edição, São Paulo, SP: Editora Ática, 1997.
LYNCH, Kevin. A imagem da cidade. São Paulo, SP: Martins Fontes, 1997.
TADESCO, João Carlos. Passado e presente em interfaces. Passo Fundo,
RS: UPF Editora, 2011.

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