segunda-feira, 20 de junho de 2011

Marchas das vadias e da maconha, homoafetividade, mamaços e bicicletaços

As marchas realizadas em diversas cidades brasileiras neste final de semana (18/19), pela liberdade de expressão e das “vadias”, somadas a outros movimentos recentes, como as paradas gays, os mamaços e as manifestações de usuários de bicicletas, revelam um novo momento dos movimentos de massa no país. Mobilizados, quase sempre pela internet e com a utilização das redes sociais como o Facebook, o Twiter e o Orkut, os manifestantes reúnem-se sem o comando dos partidos políticos ou de quaisquer outras instituições tradicionais de expressão de anseios populares.

Nem mesmo o movimento estudantil, que durante décadas manteve-se na vanguarda da contestação jovem, ocupa posição de destaque nas atuais manifestações. Ainda que integrantes deste movimento e também de setores jovens dos partidos políticos participem das marchas, eles o fazem estritamente na condição de indivíduos, sem deter qualquer liderança em função de seus vínculos de militantes estudantis e/ou partidários.

O engajamento e o ímpeto dos atuais manifestantes são de cunho pessoal e seus embates dirigem-se contra alvos de âmbito comportamental. O combate ao machismo e à homofobia, a defesa da liberdade de expressão e da homoafetividade e até mesmo as campanhas pela liberalização do consumo da maconha e de outras drogas psicoativas, os “mamaços” e os “bicicletaços” são ações de conteúdo político e de grande significado social, mas cujo centro agora é a defesa do direito a determinados comportamentos e não mais a economia ou a política em sentido estrito.

Em sintonia com o que vem ocorrendo nos países mais desenvolvidos do mundo hoje, as manifestações em curso no Brasil situam-se no campo do que se pode chamar de “pós-feminismo” e de “pós-movimento jovem”. Não têm nada a ver com os embates políticos desencadeados no Oriente Médio ou com as revoltas econômicas eclodidas nos países do sul da Europa, realizadas também sem a direção dos partidos e dos movimentos sociais tradicionais.

As manifestações em curso nos países desenvolvidos recolocam, em escala avançada, o que ocorreu no momento da deflagração da “revolução feminina” e dos “movimentos jovens”, cujas maiores expressões continuam sendo a queima de soutiens por feministas e as revoltas estudantis de Maio de 68. Também aquelas revoltas se fizeram à margem dos partidos políticos da esquerda tradicional. Tais partidos, que reduziam todos os conflitos aos embates entre o capital e o trabalho e que projetavam na sociedade socialista do futuro um universo perfeito, foram atropelados pelos fatos e quase desapareceram nos anos seguintes.

Hoje, as manifestações que reivindicam o direito a determinados comportamentos se insurgem contra valores sociais predominantes que são, muitas vezes, protegidos pela ação do Estado e incentivados por preconceitos religiosos. O mamaço questiona uma sociedade que expõe o corpo feminino ao extremo nos meios de comunicação de massa, mas restringe a exposição do seio durante o ato de amamentação. O bicicletaço se contrapõe à supremacia dos carros sobre as demais formas de transporte e as paradas gays combatem o preconceito e a violência contra as relações homoafetivas, que têm em igrejas, hoje, seus principais alimentadores. A marcha das vadias combate o machismo e a da maconha a postura do Estado frente às drogas consideradas ilegais.

Mais uma vez as aspirações populares, as contestações públicas e a política de modo amplo se renovam e mais uma vez os políticos, os partidos e muitos dos que se apregoam “de esquerda” (mesmo que se digam atualizados) demoram a perceber as mudanças em curso, seu significado e sua importância. É preciso que eles se esforcem para estar sintonizados com seu tempo e para que não sejam atropelados pelos acontecimentos.

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