sábado, 5 de janeiro de 2013

Guerra do quê?

Após 100 anos, filme tenta recuperar 
a memória do Contestado

Uma guerra praticamente esquecida completou 100 anos no dia 22 de outubro de 2012.
Mais de 10.000 mortes, de 1912 a 1916, permanecem debaixo do tapete. A Guerra do Contestado começou a ser estudada mais intensamente por historiadores a partir dos anos 1980, mas continua tímida nos livros didáticos e é pouco conhecida fora de Santa Catarina e do Paraná, onde ocorreu o conflito.

Aproveitando a data, o cineasta Sylvio Back lançou em Florianópolis e Curitiba, seu segundo filme sobre o tema, décadas depois da ficção “AGuerra dos Pelados” (1971). Com a ambição de diminuir a invisibilidade a que a guerra vem sendo submetida, “O Contestado – Restos Mortais” apresenta depoimentos de especialistas e de descendentes de ex-combatentes, além de charges antigas e uma ampla pesquisa sobre imagens e sons relacionados ao período.

“Qual a diferença entre a realidade bruta, o imaginário e sua versão contemporânea sobrevivente, depois que uns e outros são transformados em fotogramas? Talvez seja para responder a esse desafio que eu tenha voltado ao tema da Guerra do Contestado. Quão submersos, ignorados, omitidos e minimizados permanecem personagens, fatos e atos dessa verdadeira guerra civil?”, questiona o diretor.

“O Contestado – Restos Mortais” é uma mistura de ficção e documentário. Curiosamente, a parte ficcional fica por conta de depoimentos de médiuns em transe, numa tentativa de causar estranhamento e carregar o filme de certo drama. Para contrabalançar, há depoimentos de cerca de 20 pesquisadores (quatro deles presentes no dossiê desta edição: Eloy Tonon, Márcia Janete Espig, Rogério Rosa Rodrigues e Paulo Pinheiro Machado), que discutem diferentes olhares e opiniões sobre o conflito.

“Esse assunto foi tratado por muito tempo como local, mas ele lida com temas nacionais, assim como Zumbi dos Palmares ou Tiradentes. O Contestado era a luta contra o coronelismo, pela terra, por melhores condições. Já vi algumas questões de vestibular sobre o assunto, e muitos professores começam a trabalhar o tema, mas, mesmo no Sul, não se fala nisso o quanto se deveria”, afirma Paulo Machado, da Universidade Federal de Santa Catarina.

Segundo o pesquisador, os motivos do esquecimento são vários. Para ele, muitos historiadores e as elites da Região Sul não deram atenção devida ao assunto. “As pessoas realçam a imagem do Sul como europeizada, e o Contestado é justamente o contrário, pois envolveu descendentes de africanos, de indígenas... Eram todos muito pobres, do meio rural. Eles foram chamados de fanáticos, assassinos, e passaram a ter vergonha de falar sobre isso. Só se tranquilizaram depois dos anos 1980. Antes, só davam depoimentos anônimos”, explica.

Sylvio Back (foto ao lado) é o cineasta que mais tem se dedicado ao assunto. Em seu novo filme, ele se utiliza ainda de dois curtas do cinema mudo. Um deles foi feito em 1912 e retrata o enterro do coronel João Gualberto, um dos militares que agiram contra o monge José Maria e seus seguidores. O outro, dos anos 1920, mostra o trabalho da madeireira Lumber, que expulsou boa parte dos caboclos da região para vender seus lotes de terra a imigrantes. “Eu quis esgotar o repertório de imagens e sons relativos ao Contestado, que foi o mais trágico levante pela posse e contra a usurpação da terra no século XX no Brasil”, afirma o diretor.

Com informações da www.revistadehistoria.com.br



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