quarta-feira, 26 de dezembro de 2012

Aulas durante a Copa

Parecer do CNE autoriza o funcionamento das instituições, contrariando a Lei Geral da Copa


Parecer do Conselho Nacional de Educação (CNE), aprovado por unanimidade no dia 5, autoriza instituições públicas e privadas de todo o País a manter atividades escolares durante a realização da Copa do Mundo de 2014. A decisão do conselho, que funciona como órgão consultivo do Ministério da Educação (MEC), aumenta a controvérsia criada com a sanção da Lei Geral da Copa, que determina que as férias escolares compreendam todo o período entre a abertura e o encerramento do Mundial.

Entidades, sindicatos e representantes do próprio governo questionam a obrigatoriedade de suspender as aulas durante a competição, sob o argumento de que a Lei Geral da Copa fere a autonomia garantida pela Lei de Diretrizes e Bases (LDB). Segundo a LDB, o calendário escolar da educação básica (níveis fundamental e médio) "deverá adequar-se às peculiaridades locais, até mesmo climáticas e econômicas, a critério do respectivo sistema de ensino", desde que respeite a carga horária de 800 horas-aula distribuídas por um mínimo de 200 dias.

"Por que uma criança de um município no interior de qualquer Estado brasileiro obrigatoriamente terá de ficar sem aula por causa de uma partida entre Japão e Camarões em Brasília?", questiona a presidente da Federação Nacional das Escolas Particulares (Fenep), Amábile Pacios. "A Lei Geral cria uma camisa de força, sufoca a liberdade de ensinar e de aprender. Ninguém prevê férias em junho. As férias, quando existem, são em julho. A maioria das escolas dá recesso de 15 dias, e não de 30 dias." A próxima Copa do Mundo ocorrerá de 12 de junho a 13 de julho de 2014.

De acordo com o parecer do CNE, obtido pelo Estado, a Lei Geral da Copa não revogou a LDB, que "continua plenamente em vigor", conforme voto do relator, Mozart Ramos. "Há um claro conflito entre as disposições da LDB e da lei em estudo, no que diz respeito à elaboração do calendário escolar", diz o parecer, recorrendo a um decreto-lei de 1942 que determina que "a lei nova, que estabeleça disposições gerais ou especiais a par das já existentes, não revoga nem modifica a anterior". No caso, a lei nova é a Lei Geral da Copa; a anterior, a LDB.

Dois lados. Essa interpretação, entretanto, é polêmica. Juridicamente, uma lei sancionada pelo presidente da República é superior a pareceres emitidos por conselhos. Para Ramos, os sistemas de ensino deverão estabelecer seus calendários com autonomia - o conselheiro recomenda eventuais "ajustes" nos locais onde houver jogos da Copa.

Procurado, o MEC informou que "não tem conhecimento formal do parecer, que está em fase de revisão técnica no CNE". "Tão logo passe pela revisão, o MEC se manifestará sobre o seu teor, emitindo apreciação quanto aos possíveis impactos gerados pelos termos da lei", diz.

Caso seja homologada, a decisão do CNE terá caráter de recomendação. Um dos riscos com a implementação da Lei Geral da Copa é a antecipação do calendário escolar para janeiro, afetando as férias de professores e a programação dos pais. "Os sistemas de ensino no Brasil são muitos diferentes. O verão no Rio Grande do Sul é diferente do verão no Rio de Janeiro. Nosso início de aula é sempre no fim de fevereiro, início de março, depois que as pessoas fazem suas viagens para o litoral", observa a secretária adjunta da Secretaria de Educação do Rio Grande do Sul, Maria Eulália Nascimento.

A mobilização do setor educacional chegou ao Congresso, e o senador Paulo Paim (PT-RS) apresentou na semana passada um projeto que altera a redação da Lei Geral da Copa. O petista propõe a substituição da palavra "deverão" ("os sistemas de ensino deverão ajustar os calendários escolares", diz trecho do artigo 64 da lei) por "poderão", o que deixaria com cada escola a liberdade de adaptar seu calendário ao do evento.

Para o coordenador da Campanha Nacional Pelo Direito à Educação, Daniel Cara, a suspensão das aulas durante a Copa é uma estratégia das autoridades para amenizar os problemas de trânsito nas cidades-sede. "Os parlamentares têm consciência de que as obras de mobilidade urbana não serão concluídas a tempo. Aí veio a ideia pragmática de retirar o trânsito criado pelo calendário escolar", critica.

Com informações de Estadão.

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