sexta-feira, 9 de novembro de 2012

Remover a montanha ou construir o tunel?

por João Batista Costa Saraiva

Na formulação de políticas públicas, na proposição de reformas legislativas, a busca de eficiência deve nortear a ação do Estado, por seus diversos órgãos e agentes. Assim há de permanecer atento aos indicadores e estatísticas, buscando interpretar dados.

Há pouco mais de quatro anos, em uma escalada vertiginosa nos últimos dois anos, tem acontecido um fenômeno na área da delinquência juvenil. Caiu de maneira expressiva a participação de adolescentes em delitos contra o patrimônio. Roubos e furtos tiveram importante redução, segundo dados do Juizado da Infância e Juventude. Em Porto Alegre a participação de adolescentes em roubos, ações com violência ou grave ameaça, caiu em mais de 50%.

Mas como sempre, laranja madura na beira da estrada tá bichada ou tem marimbondo no pé: a participação de adolescentes no tráfico de entorpecentes triplicou.

o investimento em ações socioeducativas capazes de enfrentar essa avalanche remete ao trabalho de prevenção da violência e de resgate desses indivíduos. A tarefa não é fácil porque um menino desses, aviãozinho, ganha no mínimo R$ 50,00 por dia! Talvez o tráfico de entorpecente seja hoje o maior “empregador” de adolescentes na cidade e com certeza um gigantesco explorador do trabalho infantil, pois grande também é o número de crianças nesse ramo criminoso. 0 trabalho com carteira assinada só depois dos dezesseis anos e a escola tem dificuldades de encantar esse sujeito adolescente. A quinta série parece uma cordilheira intransponível.

A tarefa para enfrentamento disso não se esgota aqui, mas passa também pela revisão do Estatuto, a possibilidade de privação de liberdade de adolescente por tráfico (cabível somente na reiteração, segundo ampla jurisprudência dominante), o fortalecimento dos programas em meio aberto, com investimentos fortes, qualificação e especialização de atores. Lembrando sempre a lição de Marcel Hope, que para cada grama que se deixa de investir na prevenção se fará necessário um quilograma de repressão.

A crise de confiança normativa que produz o movimento pela redução da idade penal se assenta em uma percepção não raras vezes demagógica da questão, propondo alguns que se remova a montanha, quando basta construir um túnel.

O enfrentamento da delinquência juvenil não será pela redução da idade penal, via emenda constitucional. 0 aprimoramento do Estatuto da Criança e do Adolescente, enquanto mecanismo de defesa social, pode ser feito por reforma da lei ordinária, menos complexo, com quórum simples. Menos pirotécnico, menos midiático, mas muito mais eficaz.

* João Batista Costa Saraiva é juiz de direito

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