terça-feira, 31 de janeiro de 2012

100 anos do anjo pornografico


Começam as comemorações do centenário de Nelson Rodrigues

Um convite muito especial aos que estiverem no Rio esta noite: a partir das 19h, não deixem de atravessar o buraco da fechadura na entrada do Teatro Glauce Rocha (Av. Rio Branco) para prestigiar “Nelson Brasil Rodrigues — 100 anos do anjo pornográfico”. A mostra dá o pontapé inicial à série de atividades comemorativas dos 100 anos de nascimento de um dos maiores e mais conhecidos teatrólogos brasileiros.

Em entrevista exclusiva a este blog, o jornalista Nelson Rodrigues Filho, enquanto caminhava pela exposição em homenagem a seu pai, detalhou os eventos programados para o longo deste ano. “Queremos que o Brasil respire Nelson em 2012”, afirma. Confiram abaixo a entrevista:

Como você avalia o legado de Nelson na cultura nacional?
[ Nelson Rodrigues Filho] Ele tinha uma boa frase para esta definição: "Meu filho, eu sou um autor que não trapaceia. Nunca falsifiquei o homem. Por isso minha obra persiste, e será sempre atual”. Desculpe a falsa modéstia, mas eu o considero a personagem da cultura nacional mais representativa do brasileiro e de suas paixões. Meu pai começou muito jovem. Aos sete anos, escreveu uma redação sobre um marido que entrava pela janela e esfaqueava o amante da esposa. A professora deu a nota 100 (na época era 100 e não 10). Ele contava essa história rindo: "aquelas professoras vieram me ver e eu (me sentia) cabeçudo como um anão de Velázquez".

Ele era essencialmente jornalista - essencialmente não tem nada a ver com exclusivamente. Aos 13 anos, fez sua estréia como repórter de polícia cobrindo a história de um marido traído que pode ser considerada a primeira de suas crônicas de "A Vida como ela é". Há uma frase muito significativa dele nesse sentido: "sou um menino que vê o amor pelo buraco da fechadura. Nunca fui outra coisa. Nasci menino, hei de morrer menino. O buraco da fechadura é, realmente, minha ótica de ficcionista. Sou (e sempre fui) um anjo pornográfico".

O que o público verá em “Nelson Brasil Rodrigues — 100 anos do anjo pornográfico”?


[Nelson Filho] A mostra, com curadoria da Crica Rodrigues, dá o pontapé inicial em um grande projeto em comemoração aos cem anos do nascimento de meu pai. Queremos que o Brasil respire Nelson em 2012. A exposição ocorre em parceria com a Fundação Nacional de Artes (FUNARTE) e com o Centro de Documentação da entidade, o CEDOC. Reunimos depoimentos de atores, diretores e do próprio autor, e críticas e reportagens que saíram quando da estréia das 17 peças do meu pai. Seus leitores e admiradores vão gostar.

Essa mostra no Glauce é a primeira de uma série de atividades em comemoração ao centenário?


[Nelson Filho] Na dramaturgia, nós teremos o "A gosto de Nelson", uma programação pela qual durante todo o mês de agosto as 17 peças do Nelson serão montadas por vários grupos teatrais, em várias versões. E, mais: elas irão concorrer a prêmio da FUNARTE (saiba mais). O projeto tem parceria, também, da Universidade Estadual do Rio de Janeiro (UERJ), Secretaria de Cultura do Rio, e estamos em contato com a prefeitura carioca. A "A gosto" prevê, ainda, a montagem de uma peça de Nelson em cada Estado. Daí o apelo  às secretarias de Cultura para que deem força e muito apoio aos grupos locais.

Quais as outras atividades comemorativas do centenário?
[Nelson Filho]  Ainda quanto à dramaturgia, de 16 a 30 de dezembro, teremos três montagens no Municipal do Rio de “Vestido de Noiva”, estreada em 28 de dezembro de 1943 no teatro carioca. A peça é um marco da dramaturgia moderna brasileira. Dia 28, em especial, vamos remontar os cenários da peça original no Municipal, sob minha direção.Também está prevista a leitura dramática de trechos de "A vida como ela é", as crônicas escritas durante 11 anos (anos 50), para o jornal Última Hora.

Além da dramaturgia, outros setores serão contemplados?

[Nelson Filho]  Claro! Há “Nelson na tela”, mostra de cinema programada para maio-junho também no Rio e queremos viajar com ela para outros Estados. O Nelson é o autor mais filmado no país – 24 filmes se baseiam em sua obra. Será lançado, também, o documentário chamado "Quem foi Nelson Rodrigues, quem é, quem será" com participação de artistas, personalidades, diretores e produtores que conviveram com ele.
Queremos mostrar Nelson sob vários ângulos - dos que o conheceram e das novas gerações de artistas. As duas gerações poderão nos contar quem é Nelson hoje e, principalmente, quem será Nelson Rodrigues. E haverá seminários e debates no circuito universitário. Enfim, é um grande projeto. Estamos no aguardo de patrocinadores que nos ajudem a atingir o objetivo de fazer 2012 respirar Nelson Rodrigues.

Nelson, como era ele como pai?

[Nelson Filho]  Há hábitos dele que conservo até hoje. Por exemplo, ouvir música no escuro. Canções que ouvíamos - eu e meu irmão - ao lado dele. Na exposição, colocamos muitas delas. Ele gostava de um rico repertório que ia de "La Traviatta" até "A Volta do Boêmio" na voz de Nelson Gonçalves. Ele era de um carinho com a gente... Mas não era muito de agarrar. Aliás, nem podia nos pegar muito no colo, porque foi tuberculoso por muito tempo.

Este ano, inclusive, eu lançarei o "Nelson Rodrigues, pai e filho" falando exatamente da minha relação com o velho - eu de esquerda, ele um conservador. Fiquei oito anos preso pela ditadura militar. Nós estivemos em pontos antagônicos durante a ditadura. O que nos aproximou foi o amor e o respeito. Meu pai era anti-comunista, mas não apoiava a tortura. Quando me visitava na prisão, a presença dele era uma das mais concorridas ante os outros presos políticos. Ele soube por mim, porque fui torturado, que havia tortura disseminada no país. Descobriu a verdade, deu um tempo e parou de dar força [ao regime]. "Um preso é intocável" é uma de suas frases mais fortes.

fonte: Blog do Zé / Acesse aqui www.zedirceu.com.br

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