terça-feira, 12 de fevereiro de 2013

O Papa gargalhou... (por Leandro Lied)



Em julho de 1980 João Paulo II esteve em Porto Alegre para uma visita especial aos jovens seminaristas do Brasil que se preparavam para servir a Igreja como líderes espirituais e conduzir o povo católico, numa época muito conturbada de nossa história. 

Foram momentos de festa para o povo gaúcho. A euforia tomou contas da juventude que recepcionou o polonês Karol Woityla com gritos de ‘Ucho, ucho, ucho... O Papa é Gaúcho!’ tudo parecia lindo e maravilhoso se o Brasil não estivesse vivendo um período de vinte anos de ditadura militar e que o papel da Igreja na luta pela redemocratização do país estava sendo fundamental. As Comunidades Eclesiais de Base estavam tomando conta de todo o território nacional. Os movimentos populares a cada dia estavam mais fortes. As lideranças do povo cada dia mais combativas. E João Paulo II veio até aqui para ler discursos.

Assim, durante as décadas de oitenta e noventa, a Igreja Católica seguiu os conselhos do Papa. Os padres, os novos padres e o povo foram se tornando cada vez mais fieis ao magistério e à tradição viva da Igreja e abandonando as CEBs, a vida em comunidade e se voltando mais às ações litúrgicas. O resultado foi o que ninguém esperava: o grupo político assessorado pelos ideólogos das comunidades de base chegou ao comando do país e, em segundo lugar, o número dos católicos diminuiu ano a ano no Brasil.

A solução para este problema foi chamar novamente o Papa para ler novos discursos por aqui. Veio até nós o novo líder da Igreja católica, Bento XVI. De início ele pede ao presidente Lula uma lei para que as escolas ministrem aulas de ensino religioso católico, já que o Brasil é o maior país católico do mundo (em número de fiéis) e como resposta ouve que o Brasil é um país laico. Na sequência, na leitura de suas homilias surgiram frases com estas: “Precisamos caminhar. Somos impelidos a fazer algo para nos realizarmos a nós mesmos. Realizar-se, através da ação, na verdade, é tornar-se real. Nós somos, em grande parte, a partir de nossa juventude, o que nós queremos ser. Somos, por assim dizer, obra de nossas mãos... Por isso Eu vos envio para a grande missão de evangelizar os jovens e as jovens, que andam por este mundo errantes, como ovelhas sem pastor... Um homem ou uma mulher despreparados para os desafios reais de uma correta interpretação da vida cristã do seu meio ambiente será presa fácil a todos os assaltos do materialismo e do laicismo...” Na Europa, a imprensa repercutiu sobre a visita do Papa ao Brasil, mas viam-se mais reportagens sobre o crescimento das igrejas pentecostais e neopentecostais no nosso país do que sobre a recepção dos católicos a Bento XVI. E por aqui nós vimos uma multidão reunida em São Paulo e em Aparecida, era emocionante, como são todas as manifestações de fé e devoção populares. Mas ficou no ar o riso do Papa: Emoção? Alegria? Nervosismo?

E em Aparecida o Papa riu... De que o Papa riu?

Passaram cinco anos do riso de Bento XVI em Aparecida. A situação da Igreja católica parece ter piorado a ponto de provocar a renúncia do Papa, fato que se resume a apenas quatro vezes na história da Igreja, e todas elas por motivos de crise da instituição. Mais que as razões de saúde, existiriam razões de Estado que teriam levado Bento XVI a anunciar a renúncia de seu papado, nesta 2ª feira dia 11 de fevereiro. A verdade é que a direita formada por grupos como Opus Dei (de forte presença em fileiras do tucanato paulista), Legionários e Comunhão e Libertação (este último ligado ao berlusconismo) já havia precipitado fim do seu papado nos bastidores do Vaticano.

Sua desistência oficializa a entrega de um comando de que já não dispunha. Ratzinger como intelectual conservador termina seu ciclo como pontífice deixando uma Igreja católica apequenada, um retorno aos ritos do passado, um distanciamento cada vez maior entre instituição e católicos e uma disputa fratricida e autodestrutiva entre as falanges dentro da direita católica. Como também, uma legião de fieis migrando para outras profissões de fé cristãs (ou não cristãs) não menos conservadoras, mas legitimadas pela espiritualidade presente em todo o ser humano.


*Leandro Luiz Lied é Mestre em Teologia e professor de História.


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