domingo, 8 de maio de 2011

É possível liberdade de imprensa sem liberdade de expressão?


“Mijam em nós e os jornais dizem: ‘chove’”, escreve o jornalista uruguaio Eduardo Galeano. “Calam nossas palavras e os jornais dizem: ‘gritam’”, escrevo eu.
No dia 3 de maio comemora-se o Dia Mundial da Liberdade de Imprensa. Porém, no Brasil há pouco o que comemorar. E muito pelo que lutar. Ainda que o secretário de Imprensa da Presidência da República, José Ramos, tenha dito nesta terça-feira que “o Brasil vive uma situação de liberdade de imprensa plena”, essa percepção passa muito longe da realidade. É esse também o discurso da mídia hegemônica brasileira. Não poderia ser diferente, haja vista seu histórico de má convivência com a democracia e o fato de ter, ela sim, plena liberdade, inclusive para mentir, omitir, manipular, agredir. Enquanto isso, o povo vê televisão em silêncio. E não por falta do que falar, ou por falta de vontade de gritar. Simplesmente sua boca está tapada.
Sem qualquer limite, a liberdade de empresa suprime com facilidade a liberdade de imprensa, irmã da liberdade de expressão. Diz a Declaração Universal dos Direitos Humanos que “toda pessoa tem direito à liberdade de opinião e expressão; este direito inclui a liberdade de, sem interferência, ter opiniões e de procurar receber e transmitir informações e idéias por quaisquer meios e independentemente de fronteiras”. Ou seja, para a liberdade de imprensa realizar-se, é preciso que os meios de comunicação sejam absolutamente plurais e que haja total facilidade de acesso de todos os cidadãos e grupos sociais à produção e propagação de conteúdo através da mídia.
Como falar em liberdade de imprensa quando meia dúzia de famílias controla toda a circulação de informações no país? Como falar em liberdade de imprensa quando políticos com mandato e seus familiares possuem concessões de rádio e televisão? Como falar em liberdade de imprensa quando todos os movimentos sociais só ganham espaço na mídia para serem criminalizados? Mais questões: quem pode ter um jornal? Quem pode escrever em um? Quem vê seu segmento social representado em emissoras de televisão e rádio? Quem consegue com facilidade concessão para transmitir?
Onde está a liberdade de expressão? É possível liberdade de imprensa sem liberdade de expressão?
Para garantir liberdade real é preciso igualdade, paridade, é preciso dar voz a todos, o que está muito longe de acontecer. O controle de toda a comunicação brasileira por pouquíssimas pessoas é uma realidade inquestionável. A censura interna nas empresas de comunicação, em diálogo constante com o autocensura, enterra a liberdade de expressão, de imprensa e de informação.
As agressões a jornalistas, recorrentes no período da Ditadura Militar, são mais um resquício de uma história escondida pelo Estado com a complacência dos patrões de alguns desses jornalistas agredidos nos espaços públicos. É um ciclo onde ganham as elites, ganham os donos da mídia, e quem perde são os jornalistas e o povo. A violência contra o jornalista, contra o jornalismo e contra a liberdade começa na formação oligopólica da comunicação brasileira, passa pelas práticas internas dos conglomerados de mídia e, como consequência de tudo isso, chega ao desprestígio da função jornalística.
A liberdade de imprensa é impossível em um cenário de libertinagem empresarial, com desmandos à bel prazer, com propriedade cruzada dos meios de comunicação, com acordos publicitários antiéticos fustigando a possibilidade de expressão através dos veículos tradicionais. Nesse panorama, vemos a velha liberdade sem igualdade, liberdade para alguns poucos e aprisionamento e silêncio para quase todos. A construção da verdadeira liberdade passa pela ação, não pela omissão, passa necessariamente pela limitação do direito de violar a liberdade do outro.
Texto de  Alexandre Haubrich - http://jornalismob.wordpress.com/

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