terça-feira, 21 de setembro de 2010

Distribuição: o calcanhar de Aquiles


Desde os primórdios a mídia impressa descobriu as dificuldades de distribuir o produto editorial. Primeiro percebeu que o jornal tinha que ser vendido, pois a sua confecção demandava custos elevados e naquele tempo ainda não se cogitava a possibilidade da publicidade comercial cobrir, em parte, ou no todo, o ônus financeiro. Então criou-se um sistema que parecia infalível : a venda do produto em lojas freqüentadas pelo público alvo, ou seja, os 5% dos brasileiros que sabiam ler, estabelecimentos sempre localizados no bairro comercial. Concomitantemente foi desenvolvido o sistema de assinaturas que representava um custo adicional, a remuneração do Postilhão, que assim se chamava o entregador de jornal. O problema é que nem todas as residências tinham número de identificação postal, mas nada que comprometesse a entrega em cidades provincianas onde as pessoas se conheciam e apenas bastava uma referência: "moradora da esquina da padaria em frente à casa da viúva Daltro". 

Nenhum dos dois sistemas funcionou a contento. A idéia do ponto de venda acabou comprometida pelo sectarismo político. No calor dos acontecimentos pré-independência (1820-1822) era um mau negócio para os comerciantes vender no seu estabelecimento o jornal de oposição, ou de situação. Representava riscos. A idéia da assinatura vingou muito menos, pois o sistema não previa o recebimento antecipado e nem a tipografia tinha um controle de entregas efetivo, que dirá de cobranças. Quem se der ao trabalho de ler as coleções de jornais nonacentistas existentes em nossos arquivos e bibliotecas públicas, há de se deparar com queixas recorrentes da imprensa em relação ao não pagamento das assinaturas.
Assine e anuncie
Já naquele tempo algumas publicações recorreram ao sistema de assinatura compulsória que atualizando a linguagem poderíamos chamar de promoção de vendas. O sujeito recebia em casa o jornal por um período de dois, ou três meses e em seguida a proposta de pagar um valor para continuar a receber o produto. A maioria cancelava, a minoria se fazia de boba e continuava a receber o jornal em casa, poucos aderiam à proposta que às vezes era atraente: O assinante poderia inserir anúncios de até dez linhas, padrão ideal para a época, sem pagar um centavo. Ou seja: assine e anuncie grátis. É claro que essas iniciativas não poderiam dar certo e as tipografias mal conseguiam cobrir os custos da impressão dos jornais. Que sobreviviam às custas de benfeitores com interesses políticos bem definidos.
Um dia a imprensa deixou de ser elitista e passou a enxergar a massa. E aí a questão da distribuição tornou-se mais complicada. Foi então que surgiu a figura do jornaleiro, um negro escravo ou alforriado que era instruído pelo patrão para sair com uma ruma de jornais embaixo do braço gritando "extra, extra" e em seguida uma manchete que ele não sabia ler, mas decorara de antemão. A distribuição no grito, no velho estilo do mascate original, deu certo e foi assim que a grande imprensa conquistou leitores. Enquanto isso o sistema de assinaturas evoluía para o pagamento antecipado e a entrega, na cidade, através de Postilhões, e no interior através dos Correios e Telégrafos. Não deu certo no interior, pois os Correios, repartição pública, sofriam pressão dos políticos e outras pessoas na esfera do poder. No Brasil, como acontecera nos Estados Unidos, Os Correios tornaram-se instrumento para a censura à imprensa. De maneira ostensiva, mas também dissimulada. Bastava reter as encomendas.
Convencer o leitor 
Com o crescimento das cidades os jornaleiros fixaram-se em áreas geográficas determinadas, surgiram as bancas de revistas, de início móveis com rodinhas que permitiam seu deslocamento), mais tarde os quiosques e as bancas de alumínio. A partir dos 60 a distribuição torna-se logística, as revistas impulsionam esse mercado e os jornais no encalço terceirizam serviços para melhor distribuir o produto; as vendas por assinatura tornam-se um rico filão para os grandes jornais, a pesar dos custos elevados. Enquanto isso os veículos eletrônicos conseguiam chegar a todos os lares convencendo as pessoas a adquirirem uma plataforma (um aparelho de rádio, ou televisão) para receberem conteúdos a um custo não mensurado (compra do aparelho, manutenção e conta de energia), porém menor do que o custo da compra do jornal avulso.
Hoje transcorridos 201 anos da imprensa no Brasil a distribuição continua a ser o calcanhar de Aquiles. Os jornais ganharam uma plataforma, o computador, mas os leitores não querem pagar pelo conteúdo, enquanto a venda avulsa e por assinaturas permanece estagnada, ou diminui. O jornal se debate com a mesma questão de suas origens: convencer o leitor que tem que pagar pelo produto. Que a informação tem um custo e mais do que isso que a informação dele jornal é diferenciada (E é?) e por isso tem que ser paga.
Artigo de minha autoria publicado originalmente no Portal Imprensa.
Fonte: Nelson Cadena

Nenhum comentário: