quinta-feira, 6 de março de 2008

Por que a Globo só ouve a Colômbia?

Atualizado em 06 de março de 2008 às 19:55 Publicado em 06 de março de 2008 às 19:53
Por Urariano Mota, no Direto da Redação -
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Há um fato que julgamos ser indiscutível até aqui: tropas colombianas mataram Raúl Reyes. Desse fato adiante, se o morto era comandante, terrorista, ou guerrilheiro; se 15, 16, 17 ou 18 foi o número de seus companheiros mortos; se em ação, se em fuga, se em um ataque, encontro ou recontro; se o que restou do que lhes pertencera foram roupas, bombas sujas, dinheiro ou computador... tudo é nebuloso e confuso, à procura de uma resposta.

Dizemos que tudo é nebuloso, mas devemos corrigir. A julgar pelo que ouvimos, vemos e lemos em nossa grande mídia, tudo está resolvido, claro e insofismável. A começar pela qualificação, ou desqualificação, dos mortos. Substantivos e nomes não são bem um problema para os comentaristas e apresentadores da Rede Globo. William Bonner nos afirma, com aquele ar de bom moço à procura de um papel em um faroeste dos trópicos: "A crise na região foi provocada há três dias por um ataque de militares colombianos a terroristas das Farc que se encontravam no território do Equador". E mais, para que não restem dúvidas sobre o papel civilizador do presidente Bush: "O governo americano manifestou apoio à ação do Exército colombiano contra o terrorismo". O bom, a talvez única compensação de haver ultrapassado os 55 anos, é ver como velhos papéis voltam a personagens que pensávamos estar falecidos. Terrorismo, terroristas, terror, essas palavras desde a ditadura Médici não ouvíamos com tanta freqüência como nestes dias. Temos o tempo todo de nos voltar para o que os apresentadores de tevê apontam, porque dizem terrorista e a imagem na tela não é a do presidente Bush. Miriam Leitão, no Bom Dia, Brasil, comenta, e não vem ao caso observar o imenso ridículo dessa economista no papel de cientista política: "As cartas que estão sendo divulgadas pelo governo da Colômbia são claríssimas: mostram uma enorme intimidade entre o presidente Hugo Chávez e os terroristas. E mostram as negociações e os contatos entre os terroristas e o governo do Equador". Note-se que ela não entra no mérito da credibilidade da fonte. Parece até que não houve sucessivas versões do governo colombiano, que mudaram conforme os novos fatos: primeiro teria reagido a um ataque dos "terroristas", depois teria entrado em combate, até o momento em que o governo equatoriano mostrou corpos das vítimas em trajes íntimos, e com tiros nas costas. Essas bobagens não vêm ao caso, porque o vice-presidente da Colômbia Santos Calderón anunciou que: em dois computadores que pertenciam a Raúl Reyes, foi encontrada informação sobre a possível "negociação de material radioativo, base primária para gerar armas sujas de destruição e terrorismo"; os acordos entre Caracas e Quito com as Farc são evidenciados em documentos e fotografias encontrados em três computadores apreendidos no acampamento onde morreu Reyes; que em um dos arquivos encontrados demonstra-se que o presidente Hugo Chávez entregou US$ 300 milhões às Farc., etc. etc. Quem já passou pelo mau e péssimo teatro da ditadura brasileira conhece o enredo, os atos, a forma e os personagens. Na verdade, aquele hard da máquina dos guerrilheiros é uma folha em branco, a ser preenchida conforme a conveniência de Uribe e do governo Bush. Enquanto escrevo, a Folha de S.Paulo informa: "uma ligação telefônica que o presidente da Venezuela, Hugo Chávez, teria feito ao porta-voz das Farc (Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia), Raúl Reyes, foi o que permitiu a localização do rebelde, segundo relatórios de inteligência colombiana, divulgados pela rádio Cadena Nacional RCN. Chávez, emocionado pela libertação dos seqüestrados, ligou para Reyes (para informar que tudo tinha ocorrido bem), segundo 'altas fontes militares' colombianas". Isso quer dizer, e querem nos fazer crer, enfim, que nessa guerra não há espiões infiltrados nem delação. Nem, mais importante, que há um enredo prévio para os governos sul-americanos. O princípio dramático, já sabemos, obedece ao Norte e a este norte: as mentiras não devem parar. Mata-se o ladrão. Depois se procuram as provas de que o homem é ladrão.

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